AULA 1
DOS
DELITOS CONTRA O PATRIMÔNIO. O DELITO DE FURTO
Estrutura
de Conteúdo.
1. Crimes contra o
Patrimônio: Conceito de patrimônio para o Direito Penal;
Aplicabilidade do
princípio da insignificância aos crimes contra o patrimônio.
2. O delito de Furto: Bem
jurídico tutelado; Elementos do tipo (subjetivo, descritivos e
normativos); Sujeitos do delito; Consumação e tentativa; Figuras
típicas. Confronto entre o delito de furto e os crimes de
Apropriação indébita; Estelionato; Exercício arbitrário das
próprias razões; Favorecimento real; Receptação;
Peculato-furto e Roubo.
1.Crimes contra o
Patrimônio:
- Conceito de patrimônio para o Direito Penal.
OBS. Para Rogério Greco
há de se distinguir valor troca e valor de uso; o primeiro,
compreende o valor economicamente apreciável e o segundo, de
natureza sentimental, sendo, desta forma, ambos tutelados pelo
Direito Penal (GRECO, Rogério. Curso de Direito
Penal. Parte Especial. V.III.7 ed. pp 11).
- Aplicabilidade do princípio da insignificância aos crimes contra o patrimônio.
O reconhecimento do
princípio da insignificância, como estudado em Direito Penal I,
ensejaria a atipicidade da conduta face à ausência de tipicidade
material. No que concerne ao delito de furto, em algumas
situações,excetuando as figuras qualificadas face ao maior juízo
de reprovabilidade da conduta, doutrina e jurisprudência tem
admitido incidência do referido princípio.
Neste sentido, já se
pronunciou o Supremo Tribunal Federal, in
verbis:
Ementa.
Habeas Corpus. 2. Furto. Bem de pequeno valor (R$ 29,00). Mínimo
grau de lesividade da conduta. 3. Aplicação do princípio da
insignificância. Possibilidade. Precedentes. 4. Ordem
concedida.(STF,
HC
107184/RS; Relator(a): Min. GILMAR MENDES
Julgamento: 18/10/2011 Órgão Julgador: Segunda Turma).
Julgamento: 18/10/2011 Órgão Julgador: Segunda Turma).
2. Delito de Furto:
art.155, Código Penal
2.1 Bem jurídico
tutelado.
► Bem jurídico:
patrimônio, contemplando, neste caso, não só a propriedade, mas,
também a posse e a detenção da coisa móvel; (neste sentido:
Rogério Greco, Rogério Sanches Cunha, Cezar Roberto Bitencourt,
Luiz Regis Prado).
► Objeto material:
coisa móvel para fins de Direito Penal; compreende-se como coisa
“toda substância material, corpórea, passível de subtração e
que tenha valor econômico” (CAPEZ, Fernando Capez, Curso de
Direito Penal. V.2. 10.ed. pp 425); considera-se “móvel é tudo
aquilo que pode ser transportado de um lugar para o outro, sem perder
sua identidade”(CUNHA, Rogério Sanches. Direito Penal. Parte
Especial. 2 ed., pp 122)
►Classificação
doutrinária:
crime comum; subjetivamente complexo (doloso); material; instantâneo,
monossubjetivo, plurissubsistente.
2.2 Elementos do tipo
(subjetivo, descritivos e normativos);
► Elemento descritivo:
o núcleo do tipo “subtrair” representa a retirada do bem da
esfera de disponibilidade de seu titular seu o seu consentimento, ou
seja, denota “clandestinidade” na posse sobre o bem.
► Elemento subjetivo:
dolo e especial fim de agir de assenhoreamento definitivo para si ou
para outrem.
OBS.
Furto de uso. Requisitos: bem infungível, ausência de especial fim
de agir de assenhoreamento definitivo para si ou para outrem e
restituição imediata e integral ao sujeito passivo.
► Elemento normativo:
coisa alheia.
O melhor
entendimento é no sentido de compreender-se “coisa alheia” como
o patrimônio que se encontra na posse de outrem, proprietário ou
possuidor” (CAPEZ,
Fernando Capez, Curso de Direito Penal. V.2. 10.ed. pp 427).
OBS.
Disposição transitória sobre o bem – ex. famulato.
OBS. Furto
Famélico como causa justificante.
OBS.
Coisas
que não podem ser objeto de furto.
-
res nullius;
-
res derelicta;
-
res desperdicta;
2.3 Sujeitos do
delito.
Sujeito Ativo: crime
comum – qualquer pessoa, exceto o proprietário.
Sujeito Passivo:
proprietário, possuidor ou detentor, desde que tenha alguma relação
ou interesse legítimo sobre a coisa móvel.
2.4 Consumação e
tentativa.
►Entendimento
dominante nos Tribunais Superiores (STJ e STF).
Teoria
Amotio “
dá-se
a consumação quando a coisa subtraída passa para o poder do
agente, mesmo que num curto período de tempo, independentemente do
deslocamento ou posse mansa e pacífica” (CUNHA, Rogério Sanches.
Direito Penal. Parte Especial. 2 ed. pp123/124.)
Neste
sentido, vide decisão proferida pelo Superior Tribunal de Justiça:
EMENTA. AGRAVO
REGIMENTAL. RECURSO ESPECIAL. DIREITO PENAL. ART. 155 DO CP. FURTO.
DESNECESSIDADE DA POSSE TRANQUILA DA RES. CONSUMAÇÃO DO DELITO.
DESCLASSIFICAÇÃO PARA ROUBO. IMPOSSIBILIDADE. VIOLÊNCIA
DIRECIONADA PARA A RES.
1. O tipo penal
classificado como furto consuma-se no momento, ainda que breve, no
qual o agente se torna possuidor da res, não se mostrando necessária
a posse tranquila.
2. Segundo consta nos
autos, o atual agravado, na tentativa de subtrair a res, "acabou
empurrando a vítima. A vítima então acabou indo de encontro a um
muro e o réu saiu correndo do local na posse da mochila".
3. Irretocável o
acórdão estadual com relação à inexistência, in casu, de
suposta ocorrência de roubo, pois, consoante se depreende do voto
condutor do decisum, a violência foi dirigida à res, portanto não
se configura a modalidade descrita no art. 157 do
Código Penal - roubo.
4 . Segundo lição do
Ministro Moreira Alves, no voto condutor do RE n. 102.490/SP, há
quatro teorias que explicam a consumação dos tipos do roubo e do
furto. Pela teoria da contrectatio, a consumação se dá com o
simples contato entre o agente a coisa alheia. Pela apprehensio ou
amotio, a consumação se dá quando a coisa passa para o poder do
agente. Na ablatio, a consumação se dá quando a coisa, além de
apreendida, é transportada de um lugar para outro e, finalmente, na
illatio, a consumação se dá quando a coisa é transportada ao
local desejado pelo agente para tê-la a salvo.
5. O art. 155 do
Código Penal traz como verbo-núcleo do tipo penal do delito de
furto a ação de "subtrair"; pode-se concluir que o
direito brasileiro adotou a teoria da apprehensio ou amotio, em que
os delitos de roubo ou de furto se consumam quando a coisa subtraída
passa para o poder do agente, mesmo que num curto espaço de tempo,
independentemente de a res permanecer sob sua posse tranquila.
6. O agravo regimental
não merece prosperar, porquanto as razões reunidas na insurgência
são incapazes de infirmar o entendimento assentado na decisão
agravada.
7. Agravo regimental
improvido.(STJ,
AgRg no
REsp 1226382 / RS, Ministro SEBASTIÃO REIS JÚNIOR, Sexta Turma,
Julgado em 15/09/2011)
OBS.
Detectores antifurto: por serem passíveis de falha não afastam a
tipicidade da conduta, ou seja, por si só não caracterizam crime
impossível, podendo, dependendo das circunstâncias fáticas
ensejarem a caracterização da modalidade tentada.
2.5 Figuras típicas
(furto simples, furto noturno, furto privilegiado, furto de energia e
furto qualificado);
- Furto Simples – Art. 155, caput, Código Penal.
Subtrair, para si ou
para outrem, coisa alheia móvel:
Pena - reclusão, de
um a quatro anos, e multa.
- Furto Noturno.
§ 1º - A pena
aumenta-se de um terço, se o crime é praticado durante o repouso
noturno.
►Questão
controvertida – abrangência da expressão “repouso noturno”.
- Furto Privilegiado.
§ 2º - Se o
criminoso é primário, e é de pequeno valor a coisa furtada, o juiz
pode substituir a pena de reclusão pela de detenção, diminuí-la
de um a dois terços, ou aplicar somente a pena de multa.
►Requisitos: a
primariedade do agente e que a coisa seja de “pequeno valor”.
►Questão
controvertida: abrangência
da expressão “pequeno valor”.
Fernando Capez, em
consonância com os entendimentos doutrinários e jurisprudenciais
dominantes, afirma que o furto “é mínimo quando a coisa subtraída
não alcança o valor correspondente a um salário mínimo vigente à
época do fato” (CAPEZ, Fernando, op.cit.pp 442).
Neste sentido, vide
decisão proferida pelo Superior Tribunal de Justiça, in
verbis:
EMENTA.
HABEAS CORPUS. PENAL. FURTO QUALIFICADO PELO ROMPIMENTO DE OBSTÁCULO.
APLICAÇÃO DO PRIVILÉGIO DO ART. 155, § 2º, DO CP. INVIABILIDADE.
BENS FURTADOS QUE NÃO SE CONFIGURAM DE PEQUENO VALOR.
1.
A atual jurisprudência do Supremo Tribunal Federal - à semelhança
do que ocorre no crime de homicídio - passou a entender que as
qualificadoras, em especial as de natureza objetiva, não são
incompatíveis com a figura privilegiada do delito de furto.
2.
A partir dessa nova orientação, esta Corte Superior passou, também,
a admitir a figura do furto qualificado-privilegiado, desde que haja
compatibilidade entre as qualificadoras e o privilégio. Precedentes
da Quinta e Sexta Turmas.
3.
No caso, entretanto, segundo consta do acórdão recorrido, cometido
o delito em 17/2/2004, foram os bens furtados avaliados em R$ 299,73
(duzentos e noventa e nove reais e setenta e três centavos), mais,
inclusive, do que o salário mínimo vigente à época (R$ 240,00 -
duzentos e quarenta reais), não podendo ser considerados, portanto,
de pequeno valor, para fins de incidência do privilégio.
4.
Ordem denegada. (STJ,
HC 147091 / MG, Ministro SEBASTIÃO REIS JÚNIOR, Sexta Turma,julgado
em 17/10/2011)
- Furto de Energia Elétrica - §3º
§
3º - Equipara-se à coisa móvel a energia elétrica ou qualquer
outra que tenha valor econômico.
OBS.
Interpretação
analógica e Analogia.
No dispositivo
em questão, o legislador equiparou a energia elétrica à coisa
alheia móvel que tenha valor econômico.
OBS.
Acerca
da distinção entre os delitos de Furto
de Energia Elétrica
estelionato, vide decisão proferida, em sede de Apelação, pelo
Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro, in
verbis:
FURTO
DE ENERGIA ELÉTRICA - Art. 155, §§ 3º e 4º, II, do CP. -
Sentença absolutória. - Apelado, que, agindo de forma livre e
consciente, subtraiu energia elétrica da empresa LIGHT. - Recurso
ministerial pleiteando a condenação. - Com razão o M.P.: diante
do depoimento firme e coeso do técnico de eletricidade, que
afirmou ter percebido que o medidor de eletricidade estava
adulterado, do Laudo de apreensão, bem como do Contrato de
Confissão de Dívida, a negativa de autoria do ora apelado é
considerada mera consequência do exercício de autodefesa. O
administrador tem o dever de conhecer tanto o passivo como o ativo
de sua empresa. E não é crível que, pelo menos, não
desconfiasse do baixo valor aferido nas medições de energia.
Logo, se não adulterou o medidor, ao menos se beneficiou com a
irregularidade, incorrendo no crime de furto. A empresa lesada
apresentou o valor do prejuízo totalizando R$ 21.904,00,
acrescentando que a queda de energia fora registrada a partir do
dia 09/01/2004 (fls. 41 do doc. 00050). E o consumo da loja
aumentou após a normalização do fornecimento de energia (fls.
42/48 do doc. 00050 e fls. 01/12 do doc. 00090). Não obstante, o
D. Juiz restou convencido da precariedade das provas, apesar de
ter o funcionário da Light afirmado que havia irregularidades no
medidor de energia. - Portanto, dou provimento ao recurso
ministerial e condeno ROMULO MANOEL DA SILVA pela prática do
delito tipificado no art. 155, §§ 3º e 4º, II do CP, passando
à dosimetria da pena nos seguintes termos: "Em atenção ao
disposto nos arts. 59 e 68 do Código Penal,verifico que sua FAC
contem apenas a anotação referente a este processo. Assim, fixo
a pena-base em 02 anos de reclusão e 20 dias-multa, que torno
definitiva ante a inexistência de demais causas modificadoras. Na
forma do art. 44 do CP, substituo a pena privativa de liberdade
por duas restritivas de direitos a serem fixadas pelo juízo da
execução. O regime de cumprimento da pena, na forma do art. 33
do CP, será o aberto." PROVIMENTO DO APELO MINISTERIAL
(TJRJ. 0237278-34.2009.8.19.0001-
APELACAO DES. GIZELDA LEITAO TEIXEIRA - Julgamento: 18/10/2011 -
QUARTA CAMARA CRIMINAL).
|
- Furto qualificado
§ 4º - A pena é de
reclusão de dois a oito anos, e multa, se o crime é cometido:
I - com destruição
ou rompimento de obstáculo à subtração da coisa;
II - com abuso de
confiança, ou mediante fraude, escalada ou destreza;
III
- com emprego de chave falsa;
IV - mediante concurso
de duas ou mais pessoas.
OBS. Súmula 442, STJ - É
inadmissível aplicar, no furto qualificado, pelo concurso de
agentes, a majorante do roubo.
2.6 Distinção entre o
delito de furto e demais figuras típicas:
►Furto qualificado
e Roubo
No furto qualificado a
violência é praticada contra a coisa, enquanto no roubo, a
violência é praticada contra a pessoa.
► Furto mediante
fraude e Estelionato
No furto há a subtração
da coisa no momento em que a vigilância sobre o bem é desviada em
face do ardil; no estelionato a fraude é empregada para obter a
entrega voluntária do próprio bem pelo proprietário em decorrência
do induzimento a erro.
► Furto e
Apropriação Indébita
Na apropriação indébita
a coisa é entregue licitamente ao agente e a sua posse sobre a coisa
é desvigiada, no furto o agente não tem a posse do bem,
apoderando-se deste contra a vontade da vítima.
CASOS CONCRETOS.
Roberson, conhecido pelos
golpes que costuma aplicar, corta o fio da linha telefônica da
residência de Maria, mas de uma forma que não fique nenhuma marca
visível. Algumas horas depois, o agente bate à porta da referida
residência e se apresenta como funcionário da companhia telefônica,
inclusive vestindo uniforme e portando crachá falsos, afirmando que
foi detectado um problema com a linha telefônica e que precisava
verificar a instalação interna. Maria, acreditando tratar-se de
situação legítima, permite a entrada de Roberson em sua casa e,
enquanto este finge consertar o telefone, aquela volta aos seus
afazeres domésticos. Enquanto Maria estava em outro cômodo,
Roberson, aproveitando-se da ausência de vigilância, pega os
aparelhos de TV e DVD de Maria e vai embora sem ser percebido. Maria,
notando que havia sido vítima de um crime, vai até a Delegacia
Policial da cidade para registrar o fato. Diante da narrativa acima,
com base nos estudos realizados sobre os Crimes contra o Patrimônio,
tipifique a conduta de Roberson. Resposta fundamentada.
Questão Objetiva:
Assinale a alternativa
correta:
a. O furto praticado por
empregado doméstico será sempre qualificado pelo abuso de
confiança.
b. Caso alguém que
trabalhe durante a noite seja vítima de um furto enquanto dorme
durante o dia, é possível aplicar por analogia a
majorante do repouso
noturno.
c. Caracteriza furto a
subtração dolosa de energia elétrica, desde que não tenha
ocorrido alteração do medidor para o interior do imóvel,
caso em que se
caracterizará o estelionato.
d.
A utilização de cópia de chave caracteriza a qualificadora da
chave falsa no crime de furto.
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